Religiões

Panteão do Lírio

Desde os tempos mais remotos, o Panteão do Lírio era a religião mais popular do centro-leste de Partha. Antes mesmo da fundação dos reinos de Ferun e Bariya como territórios soberanos, as tribos locais acreditavam na doutrina do Lírio Branco, a flor sagrada, cujas pétalas representam os deuses distintos que são venerados e honrados em ritos de fé e cerimônias do cotidiano. Hoje a religião do Lírio é a mais popular tanto em Bariya quanto em Ferun. Embora outras fés não sejam ilegais em seus territórios, suas respectivas capitais não possuem instalações para elas; os templos e igrejas sancionados pelos reinos são tradicionalmente do Lírio Branco.

Os preceitos dos dois povos diferem em vários detalhes, como por exemplo: enquanto Bariya venera todos os deuses em suas igrejas e capelas, Ferun dedica um templo a cada deus do panteão; enquanto ferunes esculpem os deuses em estátuas formidáveis, bariyanos consideram isso de mau gosto e somente retratam os deuses e cenas sagradas em pinturas religiosas chamadas 'ícones', que cobrem as paredes internas de suas igrejas. Apesar da diferença nos preceitos citados, não há qualquer registro de conflito destes reinos baseado somente em divergências litúrgicas. No fim das contas, um bariyano adentraria um templo ferune com respeito, da mesma forma que um ferune mostraria deferência às igrejas bariyanas do Lírio Branco, pois nenhum fiel destes povos desejaria insultar um deus em sua própria morada.

Um ponto em comum que as duas vertentes da Fé do Lírio acreditam é que muitas pessoas ao longo da história provaram-se favoritas de um ou mais deuses. Estas seriam figuras de mais renome, por feitos memoráveis ou qualquer motivo que pudesse ser atribuído ao favorecimento divino. Contudo, não há crença em conceitos como semi-deuses—mestiços concebidos entre deuses e mortais—nem manifestações diretas dos deuses como pessoas confirmadas por sábios do sacerdócio. Ainda assim, ao longo dos séculos, diversos seguidores da fé já juraram de pés juntos que vislumbraram alguma pessoa ou animal que certamente era uma faceta de um deus ou outro.

Os seguidores da Fé do Lírio não perseguem membros de outras fés. Até mesmo ateus não são considerados criminosos em seus olhos, porém são vistos como pessoas loucas ou perdidas, que não merecem ser ouvidas. Elas são minimamente toleradas às margens da sociedade, mas às vezes o ostracismo é tanto que eles preferem simplesmente afirmar que crêem nos deuses do Lírio, independente disto ser verdade ou não.

A Criação

O Tempo deixou o vazio para trás em busca de companhia, pois era estagnado enquanto solitário. Ao encontrar uma terra bela e fértil em suas andanças, plantou uma semente de sombra-da-noite que, entranhando-se tão profundamente no solo, alcançou o submundo e, assim, as coisas vivas passaram a ter um fim. O Tempo plantou, então, uma semente de lírio branco. A luz alimentou a flor, que pôs as coisas vivas em moção constante, para que não findassem em vão. Desde então, o Tempo está em todas as coisas, e o Lírio Branco é o agente das mudanças ao longo dele. A sombra-da-noite, por outro lado, mantém o controle sobre tudo que nasce e cresce, sobre tudo que se multiplica, para que nada fique além do seu Tempo.

Este é o mito da criação da Fé do Lírio. Claramente uma alegoria para muitos, inclusive para os próprios sacerdotes; não há um consenso sobre como Partha veio a existir, nem o céu que lhe cobre, ou as águas que lhe rodeiam, mas o que todos podem concordar é que o tempo é o senhor de tudo e que, ao longo dele, o Lírio é um símbolo sob o qual os povos prosperaram. Contudo, ao contrário do mito da criação, os deuses não são alegorias para a Fé, mas sim agentes sempre atentos ao mundo, embora suas intenções e planos sejam um mistério sobre o qual os sábios divagam e confabulam num incessante desejo de desvendá-lo.

Os Deuses

Sol Invicto

o general; o senhor da luz

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Frequentemente visto como um líder entre as divindades, embora não mais importante ou sábio que as outras pétalas do Lírio, o Sol Invicto é o senhor da luz e do fogo, trazedor dos dias e patrono dos guerreiros e dos corajosos. Em obras de arte ele é retratado como um homem atlético e imberbe, de cabelos ondulados, portando uma lança e um escudo; outras vezes é simbolizado por um sol coroado num fulgor rubro, com um rosto neutro no centro.

O Sol é um deus guerreiro que preza pela ordem, disciplina e bravura. A ele pede-se bênçãos antes de batalhas e julgamentos, embora seus modos de arbitrar sejam dúbios; após vitórias bélicas, é comum que fiéis do Lírio saqueiem os derrotados por espólios e crê-se que não há nada errado nisso, pois a justiça dos vitoriosos é a do Sol Invicto. O senhor da luz recompensa os ousados e os fiéis que o honram com sacrifícios, preces, e difusão de seu brasão. É comum que guerreiros pintem, em seus escudos ou tabardos, uma representação sua, tal qual o sol com um semblante.

Não se considera que ele tenha um monopólio divino no conceito de justiça, apesar de sua fama de ordeiro, pois, como muitos mitos dizem, até mesmo os deuses têm disputas entre si. Muitas delas estão além da sabedoria mundana não só de leigos, mas também sacerdotes; o trabalho destes é interpretar os augúrios do dia a dia para tentar compreendê-las.

As lendas e histórias do Sol Invicto definem-no como um ferrenho protetor de seus seguidores, mas também um belicista severo numa eterna busca por conquistas, que tenta guiar o povo para alastrar a Fé como um incêndio por toda Partha. Enquanto alguns eruditos interpretam que isto deva ser feito para agradar o deus guerreiro, outros enfatizam a importância de fortificar a religião com prioridade em seus próprios territórios, aumentando os números de fiéis entre si.

Os sacerdotes vestem mantos dourados nos templos do Sol Invicto. O animal relacionado a ele é o leão.


Luna Argenta

a furtiva; lua boêmia

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Se o Sol é o mestre dos dias, Luna Argenta é a deusa da noite, e dama dos ciclos do crepúsculo à alvorada. Ela vigia os caminhos na escuridão, protege os que nela atuam, e rege as constelações que guiam as almas vivas. Os que vivem na noite pedem suas bênçãos, desde simples viajantes e caravaneiros, até ladrões e amantes secretos.

Segundo a doutrina do Lírio, ela favorece os astutos e as pessoas que aspiram ao sucesso através de esperteza e do mínimo esforço necessário. Isto pode englobar tanto o vagabundo corta-bolsas que se satisfaz com uma existência singela e hedonista, quanto o político cujos subornos e esquemas escusos garantem à sua família o poder e renome que ele deseja.

De modo geral, ela é retratada nos mitos como uma jovem boêmia, embora também tenha tomado a forma de uma mulher mais velha e tentadora em outras histórias. O consenso é que sua esperteza elude até mesmo os demais deuses, exceto talvez seu amado Barqueiro. Crê-se que eles confiam segredos mutuamente entre si, e que os fiéis mais dedicados a ela evadem até mesmo a morte em decorrência disso.

Luna Argenta é patrona das tavernas e estalagens, e é comum que elas a honrem com estatuetas ou pinturas dela: uma mulher pálida com um ramo de solanáceas em sua destra, e cabelos negros muito longos, cachoeiras de piche que só não engolfam tudo em escuridão pois suas madeixas são enfeitadas com o brilho salpicado de estrelas. Em brindes, beberrões e festejadores entornam parte de suas bebidas ao chão em oferenda à lua boêmia. Em emboscadas e espionagens, até mesmo soldados em campanha pedem sua bênção para que a luta seja furtiva o bastante para acabar antes do inimigo se dar conta.

Os sacerdotes vestem mantos brancos nos ritos da Luna Argenta. O animal relacionado a ela é a coruja.


Mãe Água

a matriarca; a mais bela

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A Mãe Água é a deusa da fertilidade e da beleza, dona dos rios, mares e chuvas, e protetora dos pescadores, gestantes e recém-nascidos. Os amores mais puros, tanto românticos quanto fraternos, são abençoados por ela. É a deusa mais presente nos pensamentos dos cidadãos comuns da Fé do Lírio, por sua postura crida materna em relação aos fiéis.

Acredita-se que ela inspira a piedade no coração das pessoas, e que os generosos têm seu favor. Além disso, a doutrina diz que as coisas belas que os fiéis podem fazer a agradam. A Mãe Água é patrona das artes performáticas como a dança, o teatro e o canto. Por esse motivo é comum que os rituais que a honrem envolvam dança, música e o sacrifício de pescados e uma parte pequena das colheitas; legumes são queimados no altar como agradecimento pela fartura, quando apropriado.

Nas crônicas dos deuses ela é a divindade que apela para a razão e resolução dos conflitos de forma pacífica. Sua sabedoria e costumeira neutralidade nos assuntos do Panteão fazem dela uma negociadora sagaz. Ela também demonstra poderes de cura extraordinários quando estes fazem-se necessários na vida de algum de seus favoritos, como quando Lucardis foi curada de uma ferida mortal pós-batalha por uma corvina ao lavar-se no rio Lugh. Portanto, ela também é a deusa patrona dos diplomatas e dos médicos. Contudo, a Mãe Água, como os outros deuses, não é infalível; ela é vaidosa e não abençoa oferendas parcas e sua fúria é despertada pela infidelidade no matrimônio sagrado que é o casamento. Adúlteros caem em desfavor com ela.

Em obras de arte ela é retratada como uma bela mulher cuja beleza atinge todos os ideais das culturas da Fé do Lírio, trajando um manto frouxo, com um seio ou o colo todo à mostra, e carregando um cesto de palha junto ao quadril, cheio de frutos e verduras variadas. Às vezes seus cabelos são parcialmente cobertos por um lenço azul claro, mas muitas vezes suas mechas loiras e encaracoladas estão à mostra.

Os sacerdotes vestem mantos azuis nos templos da Mãe Água. O animal relacionado a ela é o cavalo-marinho.


Pai da Forja

o engenheiro; o mestre artesão

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O mestre artífice dos deuses, segundo a doutrina do Lírio, concedeu à humanidade inspiração para trabalhar os recursos de Partha e transformá-los de acordo com sua vontade. Ele é o deus da metalurgia, marcenaria, maçonaria e trabalhos artísticos em geral. Os bardos cantam suas glórias, pois a invenção dos instrumentos musicais é atribuída a ele.

Tido também como o deus do comércio, todo contrato oficial de boa fé num escambo ou compra de algum produto é selado com um sinete de um martelo e bigorna, ou de um elmo com chifres decorativos, dois de seus símbolos. Contratos entre mercenários e seus empregadores também costumam ser redigidos com o Sol e a Forja como testemunhas, os deuses que garantem que a bravura e a iniciativa sejam abençoadas. Desonrar um acordo destes é um ato de extremo mau gosto que convida o azar, bem como a ira dos deuses.

O Pai da Forja recompensa a engenhosidade das pessoas e despreza a preguiça e os métodos criminosos de lucrar. Crê-se que os deuses recorrem a ele em busca de punir os ímpios quando uma pena severa é necessária para vários. Ele então trabalha sobre o mundo com seu martelo ribombante, criando as tempestades, ou, tomando a forma de um touro de ferro, ele pisa furiosamente sobre Partha para que as montanhas cuspam fogo.

Apesar de sua dureza, é um deus tão amado quanto temido, pois presenteou seus fiéis com capacidades incríveis. Do Panteão, é o mais lacônico, mas é o patrono da música e, nos contos dos deuses, seus trabalhos têm uma qualidade rítmica sobre si. Em obras de arte, é representado esteticamente como um homem muito forte com o peito nu, mas com o rosto coberto por um elmo adornado com um par de chifres de auroque. Na mão direita carrega um martelo de ferreiro e, na esquerda, uma pinça.

Os sacerdotes vestem mantos rubros nos templos do Pai da Forja. O animal relacionado a ele é o touro.


Flora Suprema

a anciã; a terra viva


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Flora Suprema é a protetora das florestas, árvores e todos os animais que andam sobre a terra ou voam os céus de Partha. Dos ermos aos pântanos, das montanhas gélidas aos desertos áridos ela sabe todos os caminhos. Caçadores a respeitam e entoam preces em deferência a ela; os povos pictos têm uma afinidade especial por ela, alguns até mesmo insinuam que esta deusa é tão antiga que houve um tempo antes do Lírio Branco, e que ela já era celebrada desde esta era.

Todo sacrifício animal, independente de em qual templo seja, deve ter a permissão da Flora. Se seu nome não for entoado na cerimônia, ele já deve ter sido honrado no abate ou na captura do sacrifício em questão. Aqueles que caçam sem prestar os devidos respeitos, em mente ou coração, podem sofrer um destino terrível através das faunas de norte a sul.

Apesar de sua cólera famigerada, aqueles que agradam a Flora são considerados gente de sorte. Aos seus fiéis favoritos, ela concedeu a capacidade de performar magia totêmica, um artifício muito temido pelos cidadãos comuns de Partha. Além disso, ela protege os mensageiros, os pastores, os caçadores, as bruxas e os ermitões e, no geral, aqueles que tiram da natureza os meios de curar ou alterar os estados de ser das pessoas por meios de herbalismo e incensos. Ela ensinou aos povos mais primordiais quais plantas e fungos eram seguros de consumir, e quais eram nocivos; e também quais eram apropriados para expandir a mente em rituais de clarividência.

Dentre os deuses, ela é a mais solitária, por escolha própria. Há pouca intervenção da Flora nas histórias de interações entre divindades. Ela possui duas formas principais de ser retratada nas gravuras sagradas de templos e igrejas: uma velha curvada pelo tempo e sorridente, com uma bengala ou cajado na mão esquerda e um cordeirinho sob o braço direito; ou uma pequena mulher de madeira com cabelos de samambaia e olhos de âmbar, sempre numa postura ereta e elegante.

Os sacerdotes vestem mantos verdes nos templos da Flora. O animal relacionado a ela é o cervo.


O Barqueiro

o deus afogado; o vigia


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O Barqueiro é o deus responsável por guiar as almas dos mortos até as profundezas que a primeira solanácea alcançou. É o deus da morte, dos conhecimentos ocultos e das memórias e sonhos que tocam a mente dos povos. Muitos crêem que é o deus mais sábio, pois de todos os conhecimentos que a humanidade anseia em obter, o da morte é o único que nenhuma pessoa viva pode, com sinceridade, afirmar que domina.

Logicamente, é ele quem vigia os funerais e ruma os campos de batalha quando a luta chega ao fim. Nas fábulas dos deuses, diz-se que a Flora Suprema concedeu ao Barqueiro os corvos, os abutres, e os animais carniceiros, para que o ajudassem em seu trabalho incessante. Ele é um deus astuto, mas taciturno e, apesar de seu amor pela lua boêmia, seus diálogos mais famosos nas crônicas são com a Flora, com quem ele troca segredos alquímicos e conhecimentos arcanos.

Os cidadãos comuns temem a magia, no geral, por estar associada ao Barqueiro e, consequentemente, à morte. Contudo, os milagres que os sacerdotes performam são considerados outro tipo de encantamento; uma bênção dos deuses em conjunto, pelo bem das pessoas em si, e não somente a alteração das propriedades de objetos, ou o uso de feitiços para causar males às criaturas vivas. Estes últimos são diretamente atribuídos ao deus afogado.

Como a Flora, o Barqueiro possui duas formas de ser retratado pelos artistas: um velho barbado, de cabelos longos—muitas vezes fluindo para o alto, como se ele estivesse submerso—e com os olhos vendados, porém com um terceiro olho aberto em sua testa; ou uma figura completamente coberta por um manto e um capuz, com a mão direita erguida e um grande olho aberto em sua palma.

Os sacerdotes vestem mantos negros nos templos do Barqueiro. O animal relacionado a ele é o corvo.



O Sacerdócio

Os deuses devem ser honrados da maneira certa e os seus augúrios devem ser interpretados cuidadosamente por especialistas para que as coisas sigam tranquilamente. Estes são os deveres dos sacerdotes da Fé do Lírio Branco. Ao traduzir as vontades e reações dos deuses aos eventos do cotidiano, eles podem instruir o resto do povo a levar uma vida de mais virtude e devoção, para que não se causem ofensas desnecessárias às sensibilidades do Panteão.

Tanto homens quanto mulheres podem tornar-se sacerdotes, ou sacerdotisas, desta fé. Seu comprometimento aos deuses requer que eles se mantenham solteiros para a vida toda, porém a consumação carnal não é proibida. É esperado que todos os deuses sejam honrados, mas cada sacerdote pode especializar-se no deus com o qual tenha mais afinidade, sendo lecionado(a) por clérigos sêniors nos ritos apropriados. Não existe uma autoridade principal na Fé do Lírio, mas sim um círculo dos maiores sábios dela, conhecidos como os sumos sacerdotes. Eles presidem as cerimônias mais importantes, ou tutelam e preparam os iniciados para que aprendam como comportar-se propriamente nos trabalhos templários e na vida em geral.

Nem todos os sacerdotes possuem poderes mágicos concedidos pelos deuses. Crê-se que algumas pessoas simplesmente têm essa afinidade de nascença e outras não, mas os que a possuem devem certificar-se de que outros usuários de magia mantenham-se no bom caminho e não desvirtuem essa dádiva para fins pecaminosos. Sacerdotes suspeitos do mau uso de magia são queimados na fogueira como hereges e não recebem as honrarias que as pessoas de bem merecem, como mais detalhado abaixo.

Ritos de Fé

Coros e cânticos
O ato de cantar glórias aos deuses, seja só ou em conjunto com outros sacerdotes, é um dos modos mais comuns de celebrar as divindades, após as preces silenciosas. Qualquer um pode fazê-lo, porém os sacerdotes usam o ritmo e as melodias destes cânticos para entrar num transe meditativo. Eles consistem em axiomas comuns da Fé do Lírio, tais como: o vigia nas águas é o senhor das almas; ó, Flora severa, nos envolva em primavera; ai dos derrotados sob as sandálias do Sol; dentre tantos outros. Quando marcham para a guerra, é comum que os soldados bradem alguns versos pela glória do Sol e do Touro.

Sacrifícios
O sacrifício de animais é um dos ritos mais importantes de enaltecimento dos deuses e acontece semanalmente em cada templo. Em ocasiões especiais, há uma frequência maior deste ritual, como antes de uma batalha importante, ou o casamento de alguém proeminente. O sacerdote pode trazer o animal ao altar diante do templo (ou um altar improvisado, no caso de um ritual de campanha), ou ser ajudado por outros membros do clero quando o animal é de grande porte como, por exemplo, um bovino. Ele deve erguer a faca em suas mãos e entoar uma prece de agradecimento à Flora Suprema pela besta concedida e, a seguir, declarar para qual divindade este sacrifício será performado e para quais fins: a bênção de uma união matrimonial, um pedido de vitória em guerra, etc. A seguir, o sacerdote deve cortar a garganta do animal e deixá-lo sangrar sobre o altar até sua morte. Daí, a carne deve ser retirada e preparada para o consumo dos fiéis presentes, enquanto as entranhas e o resto da carcaça são queimados no altar. O couro do animal pode ser vendido no mercado, ou usado pelo templo como os clérigos preferirem.

Divinações
Sacerdotes veteranos possuem diferentes métodos váticos de predizer o futuro ou interpretar agouros para entender as vontades dos deuses. Estes rituais são feitos por inúmeros motivos: para antecipar desde o clima de um dia de batalha, até as táticas que o inimigo pretende utilizar nela; qual será o sacrifício necessário para que a colheita desta temporada seja farta e abundante; qual nome um casal deve dar ao seu filho para que ele cresça saudável e próspero; dentre tantas outras razões. Alguns desses métodos são:

  • Cleromancia: o ato de jogar ossos de juntas de bode num tabuleiro de madeira;
  • Piromancia: envolve dançar ao redor de uma grande fogueira, jogando sal nas chamas para interpretar suas formas;
  • Hidromancia: jogar três seixos de âmbar numa bacia de água purificada e interpretar suas ondas;
  • Alucinomancia: o consumo de cogumelos que trazem visões alteradas e linhas de pensamento desconexas.

Qualquer iniciado da fé pode tentar performar esses ritos, mas somente um profundo estudante deles saberá como receber ou interpretar as visões que lhe serão concedidas

Casamento
Uma cerimônia de dois dias, o casamento começa com um sacrifício no templo da Mãe Água ou, no caso de Bariya, em frente à igreja. Sacerdotisas devem lavar a noiva num banho nupcial em um local fechado enquanto o noivo providencia o animal para o abate. A noiva é levada pelo pai ao altar, coberta por um leve véu que o noivo deverá retirar, simbolizando a transição de noivado para casamento. Os sacerdotes cantam louvores à Mãe Água e pedem por sua bênção enquanto o animal é queimado, e as festividades começam. Um banquete é servido até tarde da noite, quando o então marido leva sua esposa para casa para consumar o casamento. No dia seguinte as festividades continuam, embora não mais envolvendo o sacerdócio; os amigos e parentes do casal devem levar presentes para ambos em sua nova casa.

Ritos fúnebres
Quando uma pessoa morre, seu corpo deve ser purificado assim que possível pelos sacerdotes da Fé do Lírio, principalmente os devotos do Barqueiro. Eles lavam o cadáver respeitosamente sob a fumaça intensa de incensos e depois envolvem o corpo nu num pano de linho. Duas moedas são depositadas, uma sobre cada olho da pessoa, e o embrulho do corpo é enterrado sob a prece de um devoto do Barqueiro. Esta é a forma correta de prestar respeitos ao falecido, para que sua alma seja guiada pelo deus da morte até o submundo. Lá, ela será julgada eventualmente a um destino de expiação ou de conforto, dependendo de seus atos em vida. As almas que não recebem este tratamento estão condenadas a rumar o mundo físico como fantasmas, sofrendo e atormentando os que lá residem.

Hereges, contudo, são amarrados a uma estaca e queimados. Desta forma, tanto a carne quanto a alma da pessoa é extinguida da existência para que não possa rogar pragas do além, nem interferir no andamento dos planos físicos e espirituais. Esta é uma pena extremamente severa, contudo, e reservada somente a sacerdotes que usam magia para o mal, umeraques, e governantes que causam ativamente o mal de seus súditos, como barões e reis que promovem execuções em massa de cidadãos sem motivo aparente.


Dyadismo

A religião vigente do sul de Partha, principalmente do deserto de Balmut, o Dyadismo é monoteísta e sua doutrina confere o direito divino de soberania à dinastia Wazif. A maioria do povo balmute crê em Dyadis, um deus todo-poderoso benigno que é o criador de todas as coisas. É da crença dos dyadistas que Mytra, o patriarca original dos Wazif, tenha recebido, através de uma visita teofânica de Dyadis, um conjunto de mandamentos e regras que estão compilados num tomo sagrado conhecido como a Verdade Ascética. Este patriarca tornou-se o último profeta dyático e todos os soberanos que seguiram sua linhagem são considerados santos, inclusive a atual Imperatriz Mytralla.

A Criação

Antes do mundo ser criado, no firmamento havia duas entidades: Dyadis, o criador; e Ashur, o destruidor. A cada dez mil estrelas que o primeiro criava, metade delas eram devoradas pela fome insaciável do segundo. Dyadis teve, então, a idéia de criar dois mundos: o mundo sobre as águas, que é o mundo físico onde as coisas vivas rumam; e o mundo sobre as idéias, um mundo espiritual onde as verdades são livres e os habitantes são etéreos. Ambos os mundos são considerados duas faces de uma mesma moeda, porém o mundo físico é uma ilusão criada para prender Ashur e seus asseclas, enquanto o mundo espiritual é um segredo intocado por suas patas maléficas e oculto de seus olhos limitados.

No mundo físico, Dyadis criou o sol e a lua, as montanhas, as planícies, os rios, os bichos, e os seres humanos. No mundo espiritual as paisagens são repletas de cores e coisas que os vivos não podem conceber. Portanto ele decidiu que os únicos habitantes dele seriam as almas das pessoas cujos ciclos findaram no mundo físico, e os ajudantes que Dyadis criou para si, conhecidos como anjos. Estas criaturas são designadas os protetores da humanidade, os mensageiros entre o divino e o mundano, e são os únicos seres que podem transitar de um mundo para o outro livremente.

A Doutrina

Dentre os dogmas da Verdade Ascética, os mais importantes são:

  • só existe um deus, e seu último profeta é Mytra al-Wazif;
  • Mytra não morreu, mas ascendeu para sentar-se com Dyadis;
  • todo soberano al-Wazif é santo;
  • fazer o bem alimenta a fé;
  • a alma reencarna até atingir a Perfeição, o estado imaculado;
  • rebelar-se contra o Império é aliar-se com Ashur, o diabo;
  • aliar-se com o diabo é despertar a ira de Dyadis.

Os fiéis dyáticos acreditam que os deuses de outros povos são superstições bárbaras. Eles não são levados a sério e até mesmo são vítimas de escárnio em segredo, porém, para manter boas relações com os povos, dyadistas não costumam zombar a crença alheia abertamente. Outras fés hoje em dia são toleradas em território wazife, porém não recebem apoio monetário da coroa dentro do Império. A construção de outros templos nos domínios balmutes era ilegal até uma década atrás, porém foi legalizada graças ao grande influxo de imigrantes. Contudo, sacerdotes de outras fés não recebem abstenção de impostos no Império.

A etiqueta no templo de Dyadis dita que, dentro dele, homens não podem cobrir a cabeça, mas que mulheres devem cobrir os cabelos com um véu, ainda que parcialmente. Todos devem adentrar o templo de Dyadis descalços. É obrigatório remover qualquer calçado e usar uma concha para retirar água da bacia que jaz em frente ao templo, para lavar os pés e as mãos antes de entrar. Não se pode entrar impuro no lar terrestre do Senhor. Obviamente essas regras não são obrigatórias fora do templo.

Por fim, Dyadis, sendo o ser perfeito para os que nele crêem, não pode ser retratado como uma forma humana em obras de arte. Em vez disso, os símbolos que o representam são a Ankh (um modo pictográfico de escrever seu nome), uma estrela cadente no céu noturno, ou um grande leão alado.

Os Mitos

A Verdade Ascética contém muitas histórias em suas páginas, mas talvez a mais famosa seja a de quando uma coorte de anjos resolveu rebelar-se contra o Criador. Enviados há milênios, quando a humanidade ainda era jovem, estes anjos—cujos nomes foram esquecidos pelo tempo—receberam a tarefa transiente de vigiar os reis do mundo e guiá-los quando fosse necessário. Porém, o que encontraram foi uma perversão das regras divinas; sociedades repletas de crime e de más índoles, onde fratricidas matavam suas próprias famílias a troco de poder e riquezas, e onde a fé foi prevaricada de tal forma que até mesmo sacrifícios humanos eram feitos em nome do Senhor.

Ashur, o corruptor, claramente havia estendido sobre os homens sua influência macabra; porém, cegos por sua ira, os anjos não perceberam que foram persuadidos por ele mesmo a agir em resposta. Seguindo a sugestão de um ancião misterioso, eles responderam aqueles pecados de forma desmesurada, não só destruindo os ímpios com espadas de fogo sagrado, mas tomando suas mulheres e seus tronos para si e declarando-se reis do novo mundo. Desta união profana do divino com o mundano surgiram muitas abominações. Serpentes, dragões, gigantes e demônios se espalharam pelos reinos causando o caos e entregando-se aos prazeres mais primitivos. Foi então que o primeiro profeta dyático, um homem humilde chamado Senahaddon, foi visitado pelo Criador num sonho.

Neste sonho, Senahaddon estava no mundo das idéias como a testemunha humana do mando de Dyadis. A voz de Deus falou aos seus anjos o seguinte: “Eu vos digo em verdade que aqueles que antes de vós foram enviados não são anjos de meu círculo, que desempenham os meus trabalhos, mas abominações e demônios das vontades do Corruptor. Ide ao mundo sobre as águas e lançai-os no abismo eterno, com a minha luz e o meu fogo. Ide e bani as proles profanas destas uniões, os bastardos e os mestiços, que sejam expatriados além do mar de sal, e que consumam uns aos outros como meu desígnio, e que os frutos das terras e as bestas que andam sobre os ermos ou vivem sob o mar virem nada além de areia e cinzas em suas malditas bocas.”

É graças a Senahaddon que esta passagem está contida no livro sagrado do dyadismo, como um relato remoto da fúria divina e um lembrete aos fiéis para comportarem-se conforme a doutrina indica.

O Sacerdócio

Tanto homens quanto mulheres podem tornar-se diáconos dyáticos. É esperado que o comprometimento monástico seja o maior da vida dos clérigos e, por isso, o celibato é obrigatório, assim como o voto de pobreza. Os diáconos devem trajar mantos de seda branca e mantê-los limpos a todo instante. Eles podem usar jóias elaboradas, contanto que todas elas estejam relacionadas de uma forma ou de outra à fé dyática e sua simbologia: a ankh, o leão alado, a estrela cadente, e por aí vai.

As mulheres devotas a esta fé são conhecidas como as virgens dyáticas. Elas não podem ter contato carnal, sob risco de banimento da vida monástica.

Ritos de Fé

Preces escritas
Um fiel pode pedir para o clero uma prece escrita para proteger sua casa, ou um ente querido que esteja doente e não possa comparecer ao templo. Dependendo de quanto o fiel pagar, ele receberá uma plaqueta de bronze, prata ou ouro, com preces entalhadas que ele deve pôr em seu lar como instruído pelo diácono. Por exemplo: uma prece pedindo boa saúde para um recém-nascido que deve ser pendurada sobre o berço, ou uma oração de proteção ao lar que deve ser pregada à porta da casa, etc. Este costume é mais comum entre as famílias mais abastadas.

Conversão
Wazifes costumam pedir para imigrantes que se convertam ao dyadismo, pois pagãos muitas vezes são tratados como cidadãos de segunda classe nas cidades do Império, embora esta norma não seja oficial. A conversão é feita com um batismo das águas do rio Bal, ministrada por um diácono ordenado. O convertido deve admitir que há somente um deus e que seu profeta foi Mytra. A partir daí, é esperado que ele visite o templo uma vez por semana para honrar ao Senhor e purificar seu corpo e alma.

Ritos fúnebres
O dyadismo crê que, ao morrer, o fiel é levado perante um tribunal divino composto de anjos, que pegam o coração do defunto para pesá-lo e decidir seu destino. Por isso, é um costume comum que o corpo de um dyadista seja dissecado antes do enterro, para que seu coração seja posto sobre sua destra antes da jornada final. Aqueles que tiverem um coração leve são admitidos no mundo das idéias, o Paraíso; um local de eterno aprendizado, de trabalhos edificantes e prazeres transcendentais. Aqueles cujo coração pesa com os pecados mundanos são aprisionados nos fossos do arrependimento, para sofrer e meditar até que alcancem um entendimento de seus erros e sejam presenteados com mais uma vida, até finalmente herdarem o Paraíso um dia. Porém, aqueles que se deixam corromper mais e mais por Ashur, ou pela maldade em seus corações, podem acabar herdando o abismo eterno, o pior destino de uma alma.

Outras religiões

Outrora muito mais populares, as fés abaixo tornaram-se obscuras nos últimos séculos, por um motivo ou outro.

Culto dos Antigos

Ancestralismo picto

Conhecido como o culto dos velhos deuses, não se sabe muito sobre ele devido à sua quase-extinção nos últimos séculos. Algumas tribos das florestas e até mesmo cidadãos do Reino de Ferun reservam seu direito de cultuar os deuses antigos. Embora não sejam proibidos ou mesmo imputáveis, cultos pagãos costumam ser um tabú social; uma relíquia do mundo antigo e da anarquia pré-monárquica. Diz-se que os pictos veneravam animais mágicos e até mesmo árvores cujas lendas datavam centenárias em suas tradições orais. Há também fábulas sobre pessoas tão devotas à natureza que esses deuses anônimos concediam-lhes presentes peculiares, como a possibilidade de transformar-se num animal, ou de evocar forças da floresta para seu auxílio. A verdade atual é que o culto picto dos velhos deuses se ocupa primariamente da reverenciar os espíritos de ancestrais. Dal-Ghalad é uma formação rochosa de importância para os pagãos, pois lá os sábios druidas reuniam-se para eventos sagrados. Eles eram os médicos, astrônomos, herbalistas e professores das tribos pictas.

Ásatrú

Paganismo norde

Os nordes crêem num panteão vasto e muito mais humano do que qualquer religião famosa em Partha. É possível que esses deuses sejam baseados em heróis do passado, que podem ou não ter existido em carne e osso. Porém, essas tradições são desconhecidas à maioria dos povos, exceto os infames e temidos sacrifícios humanos, bem como as diversas formas de clarividência dos xamãs nordes. Além disso, o que se sabe é que Odin, que trocou um olho por sabedoria, parece ter-se esquecido de seu povo no Middelheim, o mundo dos vivos. Os pagãos nordes acreditam piamente que, apesar disso, uma vida de lutas e provações é recompensada com um lugar no salão dos heróis, após o fim. Eles queimam os corpos de seus mortos para que ascendam até lá, onde fartura e glórias os esperam, no Valhalla. Alguns acreditam que o fim dos tempos, conhecido como Ragnarök, está mais próximo do que eles imaginavam; principalmente após as invasões nos territórios de Trondheim.

Tengriismo

Xamanismo cazar

O Grande Céu Azul, ao unir-se com a Mãe Terra, criou a humanidade; e a humanidade foi criada para morrer. Um resumo simplório do xamanismo dos cazares, que vêem muita importância nos espíritos antepassados de seu povo e que também veneram o rio Bal. Os cazares pagãos realmente acreditam nos espíritos de rios, florestas e montanhas, e oram para eles conforme atravessam seus domínios, pedindo por segurança e fartura. Porém, acima de todos está o Grande Céu, o chefe de tudo, para onde todo ser humano deve retornar. Por mais milhas que se cavalgue, e por mais que alguém corra, ninguém pode fugir de sua presença. Por este motivo os tengriistas possuem a prática do funeral celestial, onde os fiéis desta fé deixam os cadáveres de seus entes queridos jazer a céu aberto para que os abutres possam fartar-se e levá-los embora consigo para as alturas.

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